27 junho, 2007

sobre mediação penal

Da mediação em processo penal. Publicação em diário da república.

Nos filmes, há sempre aqueles loucos que se propõem à missão impossível, a questionarem o perfeito juízo dos outros. Há os insanos que se dispõe ao sacrifício – seja ele de que natureza for – para desse modo soçobrar no terreno óbvio das improbabilidades (diremos a seu propósito… “mas de que é que estaria ele à espera?!”). E surge-nos assim, como óbvia consequência, a categoria daqueles outros loucos de quem posteriormente não ouviremos mais falar. Apenas a memória da sua loucura nos ressoa (ou persegue).

No mundo haverá sempre os loucos, loucos para gostos e naturezas diversificadas, cuja extrema insanidade depois concluímos ser apenas a soma de estupidez, ou de demasiada candura.

Mas de todos eles (loucos) há sempre outros que julgando nós terem perdido o juízo, regressam mentalmente tão sãos quanto sempre o foram, depois de haverem cometido o que antes conjecturávamos ser a mais perfeita demência ou imbecilidade. E nesses casos, a pergunta inverte-se e devolve-se-nos: aparentemente loucos, fomos sempre nós, por pensarmos que tal não seria nunca possível!!

O verdadeiro desafio é pois, mediar penalmente.

Por séculos conjecturou o Homem sobre o processo e os meios para a punição, conjecturou sobre a respectiva máquina (a máquina que subsiste) aquela prerrogativa estatal, que replicaria sobre os outros homens (os danados, os proscritos) um mal idêntico ou adequado àquele que houvesse sido por estes praticado. Os tribunais praticavam assim e inicialmente, a justiça de parcos meios, longe de sofisticações teóricas, uma Justiça que se adequasse ou fosse directamente proporcional ao resultado do mal praticado e que tinha por limite e única medida, a resistência do corpo do condenado, á arbitrariedade do dano.

Flagelar, torcer, martirizar, era realizar a Justiça.

O Iluminismo moderou o sangue que fervia, o ímpeto de vingar e fazer a Justiça pela pura retaliação. Trouxe elaborações ético-retributivas sobre o fins que deveriam presidir à aplicação da pena, trouxe sofisticações racionalistas sobre um entendimento alargado do Homem e suas dimensões e de como, por muito dura que houvesse que ser a Justiça, haveria um mínimo de dignidade a preservar.

O Iluminismo refreou a generalidade dos Homens um pouco para cá da barbárie (muito embora isso seja discutível!) mas não acabou com a máquina, com a mecânica do castigo, do estigma, da imposição. Pelo contrário: a preocupação com a preservação daquela dignidade implicou uma maior exigência àquela máquina e aos seus processos de punição, multiplicando-se assim os seus recursos, desdobrando-se os seus departamentos estatais, definindo-se várias naturezas e tipologias de tribunais e de processos, alargando por quilómetros intermináveis o seu princípio e o seu fim.


Se no início a Justiça e a mecânica da punição que sempre lhe foi associada, nos parecia sanguinolenta, ainda que feita por Homens, hoje estes sujeitam-se às suas consequências e determinações, à auditoria burocrática do cumprimento das penas, sabendo cada vez menos sobre os seus fundamentos e as suas razões e menos ainda, sobre quem a realiza. Alguém a domina inteiramente? Que rosto, que humanidade revela a Justiça?

Por isso, a convocação legal para mediar penalmente, para repor e definir no meio da arquitectura babilónica, um acerto de equidade entre rostos, entre a substância dos sentimentos, da consciência, é o verdadeiro desafio (loucura/desatino?). Porque no essencial, a Justiça de hoje, já não é feita por Homens capazes de reconhecer o arrependimento e a misericórdia, capazes de expressar directamente o perdão. Esse hoje, chega sempre no meio do arrazoado de uma notificação administrativa, não da boca de alguém!

A pergunta é pois pertinente: frente ao gigantismo mecânico e burocrático pelo qual se produz a Justiça, haverá um imbecil, um louco em todos nós, capaz de um primeiro passo para repor o homem como centro de tudo?

O Hospital Psiquátrico Magalhães Lemos que se cuide....

18 junho, 2007

gathering around the table


encontro 4.ª feira, vila galé. 20.00 horas.

"The Gold Rush" por charlie chaplin - 1925, Charlie Chaplin Productions.